sábado, 10 de abril de 2010

O Sonho de Cassandra (Cassandra's Dream)


O Sonho de Cassandra (Cassandra's Dream)
EUA / Reino Unidos/ 2007/ 108min.
Roteiro e direção: Woody Allen
Elenco: Colin Farrell, Ewan McGregor, Tom Wilkinson, Hayley Atwell, Clare Higgins

Com mais de 40 filmes em seu currículo, Woody Allen é largamente conhecido pelas suas comédias. Principalmente por ter chegado ao cinema através deste estilo. Entretanto, já presenteou o mundo com ótimos dramas e questionamentos humanos que permeiam seus trabalhos.

Gosto muito da sua fase pós Match Point e, de certa maneira, pós - Nova Iorque. Explico: ao realizar Match point, em 2005, deixou as terras americanas para filmar em locações estrangeiras.

De lá para cá já foram três longas realizados em Londres (o próprio Match Point, Scoop e O Sonho de Cassandra) e um em Barcelona (Vicky Christina Barcelona). Isso não quer dizer que o cineasta tenha abandonado a sua terra natal. Inclusive seu último filme, Whatever Works, volta a ter NY como pano de fundo.

Entretanto implica dizer que Allen resolveu se abrir a novas possibilidades. Passando a abraçar oportunidades estrangeiras que fazem com que ele desenvolva suas idéias em lugares novos. Seu mais recente filme, sobre o qual ainda não se tem muita informação, vai se passar na França e deve contar com a cantora e primeira dama francesa, Carla Bruni, além de Marion Cotillard (Piaf) no elenco.

Diferentemente de suas comédias, O Sonho de Cassandra, de 2007, apresenta um drama repleto de suspense. Na trama dois irmãos enfrentam situações difíceis.

Ian (Ewan McGregor) trabalha no restaurante do pai, mas seu maior sonho é sair de lá. Enfrenta os dias difíceis com o intuito de deixar seu pai bem e capaz de lidar com o negócio sem ele. Vem de uma família simples, mas sonha grande. Quer viver com dinheiro e luxo. Para isso, pretende investir no ramo hoteleiro na Califórnia.

Terry (Colin Farrell) é bem diferente do irmão mais velho. Trabalha em uma oficina e nutre desejos mais humildes. Quer constituir uma família e, quem sabe um dia, abrir uma loja de artigos esportivos para ser seu próprio chefe. Espera viver bem e de maneira simples ao lado de sua namorada. Mas tem um problema: bebe e joga demais.

Apesar das grandes diferenças de estilo, personalidade, ambição e até mesmo caráter, ambos se dão muito bem e têm a consciência de que a família é o que há de mais importante no mundo. São muito unidos e compartilham uma profunda amizade.

Começam o filme em um clima de sorte. As apostas de Terry parecem recompensar os riscos e Ian está empolgado com as possibilidades de negócios à sua frente. Mas tudo que apresenta grandes riscos pode ruir rapidamente. Dessa maneira as apostas de Terry os levam a uma situação difícil.

A única chance dos irmãos é recorrer à ajuda de Howard (Tom Wilkinson), um tio rico que está vindo à Londres para comemorar o aniversário da irmã, a mãe dos dois encrencados.

A questão é que nada na vida vem de graça e, embora o tio costume ajudar a família, ele mesmo aparenta estar com alguns problemas. Portanto para ajudar a dupla ele precisa de uma forcinha em troca. Forcinha essa que não se mostra muito simples.

Assim como Woody Allen costuma fazer, O Sonho de Cassandra apresenta diversos planos-seqüência e abusa dos diálogos. Coisa, que convenhamos, ele domina muito bem. Normalmente é difícil lidar com falas excessivas no cinema. Meio que, naturalmente, pede imagens no lugar de palavras. Mesmo assim, através dos anos, Allen insiste em abusar dos diálogos e, mesmo assim, costuma fazê-lo muito bem.

Nesse caso o roteiro funciona ainda melhor porque Farrell e McGregor estão à vontade em seus respectivos papéis, além de compartilharem uma ótima química na tela. Seus desempenhos estão muito bons.

O filme em si apresenta uma espécie de anticlímax que pode desagradar muitos ou mesmo parecer uma inabilidade para concluir a história. Mas essa maneira abrupta de interromper a narrativa nos remete à vida, afinal o fim não chega inesperadamente para a maioria? As coisas não costumam se resolver de maneira inesperada? As linhas não estão previamente traçadas. Por vezes o que nos atormenta durante meses se resolve em um segundo.

Alguns dos temas abordados pelo diretor retornam nesse filme: o pessimismo diante da vida e das suas possibilidades é um deles. A existência de Deus e a culpa que isso pode gerar, além do dilema da ética e da moral também são abordados. O que é certo? Até que ponto podemos empurrar a linha entre o certo e o errado para conseguirmos o que queremos sem que as consequências sejam drásticas?

O Sonho de Cassandra não foi muito badalado quando lançado, mas vale a pena. Simples, estruturado e repleto de tensão e suspense.

SPOILER!

A questão aqui é a impotência do ser humano diante da vida. De uma maneira ou de outra a vida arrasta as pessoas de seus sonhos e as confronta com a realidade. É necessário tomar decisões e essas decisões geram complicações. A realidade é difícil.

No caso de Terry e Ian, por exemplo, se eles não aceitassem a proposta do tio, Terry não conseguiria se livras dos agiotas e teria um final terrível. Aceitando a proposta passam por cima da sua moral e não conseguem lidar com a decisão de uma maneira satisfatória.

A incapacidade de Terry aceitar o ato que cometeu o leva a se mostrar fraco, a apelar para a bebida e se afundar cada vez mais. Em contrapartida Ian se mantém frio e aprecia as vantagens que conseguiu, mas não admite que ninguém ameace tirar essas vantagens dele, nem mesmo o seu maior amigo, seu próprio irmão.

Outra questão aqui diz respeito ao dilema entre o certo e o errado. Vale a pena passar por cima do que se acredita a fim de conseguir o que se quer? Terry se mostra fraco para escolher e não consegue assumir a sua parcela de culpa alegando sempre que foi levado a agir como agiu. Mas não seria essa atitude mais fácil do que admitir que o erro também foi dele? Ian, em compensação, não enfrenta o mesmo problema, mas se deixa levar pela sua ambição sem medida. As diferenças entre os irmãos se mostram mais sérias quando confrontadas em uma situação tão extrema como essa.

Agora? Darren Hayes. Mas já que mencionei Carla Bruni, fica a dica: Raphael.

Um comentário:

Marina Bonv disse...

O filme Vicky Christina Barcelona me fez refletir em muitos questionamentos também. E saber que o Woody Allen faz filmes com isso só me deixa com mais vontade de me aprofundar em sua coleção.