terça-feira, 12 de outubro de 2010

O retorno do Capitão Nascimento



José Padilha consegue estabelecer um diálogo consistente entre o arrasa quarteirão e a reflexão

Tropa de Elite 2 - O inimigo agora é outro
Brasil/ 2010/ 116 min
Direção: José Padilha
Roteiro: José Padilha, Bráulio Mantovani
Elenco: Wagner Moura, André Ramiro, Maria Ribeiro, Pedro Van Held, Irandhir Santos, Seu Jorge, Milhem Cortaz, Fernanda Machado, Tainá Müller

A verdade é que quando a notícia de que Tropa de Elite teria uma continuação começou a ser divulgada eu fiquei receosa. Continuações não costumam ser muito boas e, geralmente, conseguem afundar um bom trabalho. Além do mais, filmes de sucesso que se destacam na bilheteria podem cair na tentação de uma sequencia que vise apenas lucros. Sendo assim, o meu receio foi grande. Felizmente essa preocupação se mostrou infundada e Tropa de Elite 2 – o inimigo agora é outro chega às telas de maneira competente e, acima de tudo, muito consistente.

Desde o primeiro longa, passaram-se 15 anos e, agora, Capitão Nascimento (o ótimo Wagner Moura) continua no BOPE, mas deixou as ações externas em função do cargo de Tenente-coronel. O seu antigo posto está sob o comando do Capitão Matias (André Ramiro), apresentado ao público no primeiro filme, mas que no decorrer de mais de uma década amadureceu e deixa de ser um aprendiz (aspira) para se tornar um profissional completo.

O ponto de vista dos caveiras é o mesmo e, no meio do caminho do Tenente-coronel Nascimento está o ativista dos direitos humanos, Fraga (Irandhir Santos), que se posiciona contra os métodos do BOPE. Após complicações em uma ação, o Capitão Nascimento é levado á trabalhar como subsecretário de segurança pública do Rio de Janeiro. É a partir do momento que ele passa para “o outro lado” que a sua percepção de certo/errado e também do inimigo do título começa a ser ampliada.

O interessante é que os dois filmes conseguem manter uma unidade tanto estética como narrativa, mas isso não significa dizer que se trate de uma repetição. Pelo contrário, com o segundo longa a narrativa consegue avançar em relação à história apresentada no primeiro filme. Aprofundam-se os temas abordados anteriormente e o longa deixa de ser centrado em um personagem para ampliar o seu foco para um tema maior. Nesse caso, a corrupção no poder público.

A problemática pessoal e familiar do Capitão Nascimento é mantida. Os conflitos desse com o seu filho adolescente e a relação abalada com a sua ex-mulher têm espaço na trama, mas o verdadeiro foco é mesmo a corrupção.

José Padilha trabalha tanto com o documentário como com a ficção e, nesse filme, volta a abordar uma estética híbrida que mescla elementos de um e de outro estilo. Os créditos iniciais ressaltam que, apesar das semelhanças, Tropa se trata de uma ficção, não estão ali por acaso. Realmente a história e os personagens são fictícios, mas a crítica à realidade é explícita e, apesar das frases de efeito, dos momentos heroicos e de alguns clichês, a semelhança com o real é palpável. Já na questão estética esse hibridismo também é percebido, por exemplo, através do recurso recorrente da câmera na mão que provoca a sensação de que as cenas filmadas são de fato verídicas e remetem à estética documental.

O elenco se destaca e dá um show à parte. Os antigos e os novos personagens são apresentados de maneira competente e, embora alguns deles sejam um tanto caricatos (à exemplo do apresentador de TV), funciona muito bem para a trama.

Outro aspecto que corrobora para o destaque do filme é o fato de a trama abordar as eleições e como a corrupção pode afetar esse processo. Apesar de José Padilha afirmar que a estreia às vésperas do segundo turno presidencial tenha sido uma coincidência, não se pode negar que essa seja uma coincidência feliz, afinal além de agitar e incrementar a discussão, deve contribuir para um maior número de espectadores.

Mas o principal mérito do longa consiste no fato de conseguir dialogar entre um clássico arrasa quarteirão, com direito a violência, tiros, explosões, frases de efeito, clichês e muita briga, e um filme capaz de provocar reflexão e um debate que vai além da sala de projeção. O resultado é um trabalho bem estruturado capaz de dialogar com um maior número de pessoas. O público lucraria muito se mais obras conseguissem esse feito.

Adrenalina do começo ao fim, Tropa de Elite 2 é um daqueles filmes que prendem a atenção desde o início. Mas felizmente provoca mais do que apenas cerca de duas horas de abstração.

Agora? Stereophonics.

3 comentários:

Bruno Costa disse...

A fórmula para este filme foi perfeita. Eles souberam a hora de disparar os tiros e a hora de disparar as palavras. Uma boa reflexão e crítica social com uma bela pitada de bang bang. Apesar de suspeito pra falar, o filme é perfeito. Eu diria que no primeiro filme a gente sai do cinema com vontade de ser do BOPE. No segundo, a gente sai do cinema com vontade de tatuar uma caveira no peito, apenas pela vontade de andar com os 'justos'.

Anônimo disse...

Eu concordo, com tanta corrupção e impunidade, você sai do cinema, com a expectativa que existam capitões Nascimento lutando por justiça.FACA NA CAVEIRA

Anônimo disse...

Natali

Ora pois, pois! No país mais corrupto do mundo, o cinema tem sempre vez e tela. Que tela, que seja policial, pois a vontade emana de todos os brasileiros com vontade de ver sangue! E que fosse daqueles ... principalmente para tentar derrubar essa nova ditadura que se instala. Corrupçao, insegurança, mentiras, representantes corruptos, servindo de cabos eleitorais, escravidão fascista, brigas e baixaria pelo poder e pela permanência. Quisera que fosse um pais das arabias, seria voluntário, oh deus perdoe meus maus pensamentos! Ainda é tempo de ter esperança e sonhar. Adorei seu curta "Feito Algodão Doce", que os sonhos fossem extensivos aos adultos pela imaginação da estabilidade social e não pelos caminhos dos governos ditatoriais. Quisera seu curta chegasse as centenas de jovens que estão escravizados pelo assistencialismo no nordeste que poda o mais digno do ser humano, que é a predisposição e motivação ao trabalho.
Um abraço do seu fã em Natal

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