quinta-feira, 1 de abril de 2010
Passo Lento
Beto passava diariamente pelas mesmas ruas estreitas. De casa para a escola. Da escola para casa. Eram apenas três quarteirões.
Ele gostava de contar as ruas, as pessoas, as bicicletas vermelhas e tudo o mais. Gostava ainda de viver grandes aventuras durante os preciosos minutos que tinha consigo mesmo. Uma vez salvou um grupo de pessoas. Outra vez pilotou um avião. Em outra ainda, finalmente teve coragem de falar com Lu e dizer que ela era a menina mais bonita da escola. Aliás, a mais bonita que ele já vira com aquele vestido vermelho e seus longos cabelos castanhos. Até andaram de mãos dadas.
Um certo dia Beto avistou uma senhora de passos lentos que usava um vestido florido. Pensou que ela deveria ter muitas histórias e que seria interessante conhecê-las. No dia seguinte a senhora também estava lá.
Passou a vê-la quase que diariamente. Sempre naquele passo lento, impondo-se ao mundo ao invés de aceitar o ritmo frenético que acometia as demais pessoas.
Ficou tão curioso! A senhora era simpática e sempre sorridente. Cada ruga sua guardava uma história – ele tinha certeza. Encontrava-a caminhando pela calçada, à beira de sua janela olhando para a rua por onde Beto caminhava, cuidando do jardim.
Ele gostaria de conversar, mas não tinha coragem. Acostumou-se a observá-la de longe. Imaginando diversas histórias e aventuras. Foi assim durante alguns meses até que não a viu mais.
As janelas que costumavam guardá-la permaneciam fechadas. O jardim, intocado. Em sua última passagem pela rua estreita viu dois pares de roupas pretas pregando uma placa de ‘vende-se’ na fachada da casa verde. Eram jovens, talvez conhecessem as tais histórias que ele não foi capaz de perguntar.
Mudou o seu caminho.
Ainda hoje pensa que teria sido maravilhoso conversar com a senhora do passo lento, sorriso largo e vestido florido. Que teria sido bom ter dito que ela transmitia alegria e que ele a admirava por isso.
Natali Assunção.
Agora? Kings of Convenience.
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2 comentários:
Lindo conto!!!
Bjs
Seu texto é de uma sensibilidade impressionante. Parabéns!!!
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