terça-feira, 28 de dezembro de 2010

O espírito 2000


Estava lendo a Ilustrada no cinema e me deparei com esse texto do Bruno Yutaka Saito:

"O espírito 2000

Há cenas de filmes que sintetizam um espírito de época. Os poucos segundos da dança de John Travolta e Uma Thurman em “Pulp Fiction” são a visão clara dos anos 90.

Luke Skywalker e Han Solo, de “Star Wars”, ou o Marlon Brando de “O Poderoso Chefão” personificam a nova Hollywood dos anos 70.

“Os Incompreendidos” (1959) e “Acossado” (1960) são as diretrizes para se entender os anos 1960.

Hoje, isso está claro. Mas, e no calor do momento? Conseguimos, hoje, ter uma visão clara desta primeira década do século 21? Se uma análise mais profunda ainda é prematura, já que a história ainda está sendo escrita, conseguimos ao menos tatear.

Tento seguir um critério simples, escrever de imediato, ao pensar nos principais filmes da década. Não me refiro aos melhores. Mas aqueles que, de alguma maneira, explicam o que é o cinema entre 2001 e 2010. Meu método, que muitos chamarão de superficial, é puxar pela memória. Tente fazer isso. Você pode se surpreender com o resultado.

BRASIL, MUNDO CÃO
A retomada do cinema brasileiro foi nos anos 90, mas nos anos 2000 uma fórmula se mostrou quase sempre eficaz. Denúncia social + violência nua e crua = sucesso. Assim o Brasil conseguiu ir para o exterior, com filmes como “Cidade de Deus” e “Tropa de Elite”. A explosão de “Tropa de Elite 2” é extra-fílmica, um evento sociológico. Outros exemplares: “Carandiru - O Filme”, “Ônibus 174”.

TODOS CONECTADOS
Alejandro González Iñárritu e Guillermo Arriaga transformaram em dogma a estrutura de histórias paralelas no mesmo filme, para sugerir que todas as pessoas estão interligadas. É a velha história do efeito borboleta: o bater de asas de uma borboleta pode influenciar até um tufão do outro lado do mundo. O Oscar de melhor filme para “Crash - No Limite” só veio coroar essa moda. Outros filmes: “Babel”, “21 Gramas”.

GERAÇÃO MULTIMÍDIA
É nos anos 2000 que o trio Charlie Kaufman, Michel Gondry e Spike Jonze fizeram a festa. Egressos da cultura dos videoclipes, do skate, é uma geração criada não apenas na cinefilia, mas na releitura pós-pós-moderna dos itens de consumo da cultura pop. Filmes: “Adaptação”, “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças”, “Onde Vivem os Monstros”.

GUERRA ANIMADA
Para explicar os horrores da guerra, é necessário uma reinvenção, um novo olhar sobre a realidade. Uma câmera não parece ser mais capaz de dar conta de registrar e reproduzir a surrealidade do real. Filmes: “Persépolis”, “Valsa com Bashir”.

SAGA
Cinesséries são parte fundamental de uma década. Os anos 2000 serão lembrados por duas sagas gigantescas: “O Senhor dos Anéis” e “Harry Potter”, iniciadas em 2001.

O NOVO FUTURO DO CINEMA
“Avatar” é o primeiro de uma saga, mas, ficará marcado pelo fato de trazer o 3D de volta ao noticiário. Após o filme de James Cameron, o 3D virou o Santo Graal do cinema. Mas nem só de tecnologia vive o cinema.

RENOVAÇÃO ASIÁTICA
Depois dos cinemas novos pelo mundo afora, são os cinemas nacionais que dão o sopro de renovação. É na Ásia onde surgem alguns dos exemplares mais surpreendentes. Filmes: “O Hospedeiro”, “Oldboy”, “Síndromes e um Século”.

ANIMAÇÃO DE ADULTOS
Animação virou cinema de autor, local para se experimentar fórmulas e discutir temas sérios. Filmes: “A Viagem de Chihiro”, “Up - Altas Aventuras”.

EXISTENCIALISMO MADE IN USA
Fãs de Antonioni podem se entediar, mas Sofia Coppola encontrou seu rumo ao virar cineasta. E, em filmes como “Encontros e Desencontros” e “Um Lugar Qualquer”, propõe uma pausa para questionar a existência em uma potência tão obcecada pelo sucesso.

SUPER-HERÓIS
“Homem Aranha” é o exemplo mais bem acabado de como um filme pode ser fiel à HQ que lhe inspirou e ser uma grande obra de arte ao mesmo tempo. Pena que, no decorrer da década, até heróis de quinta categoria ganharam seus filmes. “Batman Begins” segue por outra via, ao optar pelo realismo, como se tivesse vergonha de ter surgido a partir de uma HQ."

Compartilho porque me parece interessante tentar fazer essa avaliação durante tais transformações. De fato é difícil determinar algo concreto nesse momento, mas isso não nos impede de refletir a respeito, não é?

E, apesar da técnica de "puxar pela memória" ser bem básica, muitos dos itens apontados por Bruno Yutaka Saito foram os mesmos que surgiram na minha memória. Em especial a saga e o novo futuro do cinema. Eu ainda incluiria os remakes e releituras. A transformação e o novo olhar sobre filmes consagrados. Entrariam aí também as adaptações não só de HQs, mas também de obras literárias e afins.

Agora? Billie Holiday.

3 comentários:

Anne Durey disse...

Concordei bastante com "saga" e "animação de adultos" foram as duas coisas que me vieram logo à cabeça. Não sei se "todos conectados" se enquadraria bem numa definição pra década, acho que foi muito pontual.

Legal a reflexão que o texto propõe. Tudo bem que só vamos poder definir o que traduz a década com os possíveis desdobramentos que ela terá nas próximas, mas acho muito válido.

João Roberto Cintra disse...

Adorei o texto amiga, muito boas considerações... Tenho que ler mais seu blog!! hehehe

Caleidoscópio disse...

É, eu tb acho, João;)
=***